Poucas coisas me
provocam um pânico semelhante ao de ver a minha gata dormir de olhos revirados.
Já sei que é normal, que é porque está num sono profundo, etc… No entanto, por
muito consciente que seja da naturalidade deste pormenor, a verdade é que sou
incapaz de assistir e manter-me quieta. Abano-a com toda a força até que
desperte – não é um processo tão automático quanto seria de esperar - e fico atónita
durante a fração de segundos em que assisto ao seu regresso à realidade. Ou à
vida. Porque mais parece que está a ressuscitar: a pupila faz um movimento
estranho enquanto os pulmões recebem uma espécie de sopro da vida. Creepy.
Hoje isto aconteceu duas vezes, praticamente seguidas! Ninguém pode imaginar o
aperto no meu coração. O meu pai dizia-me, Deixa-a dormir, Raquel, e eu
argumentava que não podia, não assim. Fiquei a observa-la de perto sem prestar
devida atenção ao filme. Tinha de garantir que, pelo menos durante a minha
presença, ela não voltava a pender para o universo paralelo.
O pobre animal observava-me aturdido e eu senti-me uma torturadora por estar a
priva-lo do ansiado descanso. Desculpa. Mas tens mesmo de fechar os olhos.
Lembrei-me que o meu primo também fazia isto quando era bebé. Assustei-me de
morte quando o vi adormecer de olhos revirados pela primeira vez. A minha tia
tranquilizou-me, Está a ter um sonho muito profundo, mas a mim parecia-me que
estava a roçar um transe fatal. Tive de conter-me para não dar-lhe um safanão.
Ai que horror, resmunguei, imagine-se o trauma que não foi, para ainda recordar
este episódio tão nitidamente…
Agora questiono-me se eu alguma vez fiz isto. [Tenho de sondar os meus pais...]
Nos últimos tempos convenci-me de que era o ser mais tranquilo do mundo a
dormir… Aparentemente estava equivocada, já que recebi queixas de falar idiomas
demoníacos e imitir sons orgásmicos. Mas é culpa do Verão, a sério que sim. E
como Agosto é oficialmente o mês das insónias, alegro-me de não partilhar a
cama com ninguém durante estas férias.
Somente com a gata. Torturamo-nos mutuamente e lá nos entenderemos…
Raquel Dias
Raquel Dias
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