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10 de março de 2014

saber-te sem ser-te sol

Quis saber-te sem ser-te sol
ao ritmo do lençol enleado
do teu coração inadaptado

a lua não tem significado.

Fazes-me perguntas estranhas
nas entranhas algo se move
quase me comove o quarto crescente

a tua mente desinibida.

A partida é sempre tão fria
encolho os ombros
recolho os escombros

mas sempre renasce o sonho na tua vinda

É o faz de conta, o não contes a ninguém,
é o estar mais além da exosfera
na quimera da lua nova

que de tão nossa se fez cheia. 


Raquel Dias

20 de janeiro de 2014

Roda da Fortuna

O movimento desatento dos teus olhos que ardem em fogo lento
a minha audácia desaparecida temida pelo peito rígido
frígido
Gestos incoerentes, eu não sei se quero, o que é querer ou ter
alguém
As mãos procuram-te, o sonho encaixa, rasga-se na suposição de um
não funciona
Uma tremenda dor no fundo, que um sonho profundo me resgate
que me ate ao teu sabor
Amor, eu não sei chamar-te, não sei como dar-te o que não possuo,
intuo que o saibas
Ainda assim as mãos, o latir baixinho do coração, o ser-se não mais tudo
no seu momento oportuno
Eu repito, eu insisto, haja algo que nos destrua, que nos una,
que interrompa a roda da fortuna...












     
 Raquel Dias

10 de dezembro de 2013

querem envenenar-me

anoitece arrefece a cidade não pára não cessa
a pressa vai nos passos vai nas cabeças
nas miradas vesgas a quem passa ao lado
no rescaldo da noite besta animal
a manhã sabe-nos mal mas vamos
penetramos as ruas de mãos nuas e frias
alegoria de uma vida outra qualquer outra
uma consciência rouca que se custa a ouvir
vem faminta desde o cerne a dizer-me que espere
mas eu tenho de ir
aqui querem envenenar-me
querem dar-me a vida pela metade
- mas eu quero arte e amar-te sem sentido
o perigo adjacente a ser-se gente sem ouvido
mas cujos olhos repousam na cidade
na efemeridade de saber-lhe o sentido


Raquel Dias

29 de novembro de 2013

meu mundo anfíbio

um suspiro exausto,
holocausto da prudência, eis o termo adiado,
meu mundo anfíbio, versátil, nojento,
ao tempo que a virtude morreu…

28 de novembro de 2013

música para levar-te

Música para levar-te
e dar-te a noite fera domesticada 
um piano que morre baixinho
na alvorada do teu caminho 
e uma canção que fica no ouvido 
no peito dorido pela repetição

Dizer-te não eu não saberia

Como seria a tua estrada sem mim 
uma outra balada, um outro fim, 
luz da aurora nos confins da demência 
a tua ausência não a sente ninguém. 
- então para quem são os acordes, 
as odes que escondes nas entrelinhas?

O Tejo já se adivinha

as águas tristes da tua Rainha
uma casa morna vazia
onde te esqueces das vestes despidas


(Música para encontrar-te 
Para olvidar-te sem remorsos)




Raquel Dias



3 de outubro de 2013

dia oportuno

Perdas que chegam fora de tempo
Bem-vindo à masmorra dos arrependimentos, ao lo siento, foi por um triz,
Eu bem que quis mudar-te a vida durante um sentimento esquivo,
Mas tu escapaste ao tiro e eu fugi para os confins da terra,
Já era, esse dia oportuno,

Fez-se fumo toda a espera. 

Raquel Dias

27 de setembro de 2013

como dois estranhos

eu a dizer-te fica, deixa-te ficar, de olhos exaustos líquidos mendigos,
deixa-te ficar na expectativa, no limite dos assombros,
eu assusto-te quando choro?
e se me demoro na despedida, e se eu insistir, fica,
como é que ficamos?
como dois estranhos que se entrelaçam de súbito e logo vestem as calças, procuram a blusa, então, adeus, adeus.
uma concubina chorona, ridículo, ora ai tens, para teu desagrado, carne e osso e sangue e alma,
mais que uma vontade abrupta, uma suplicia, um deixa-te ficar,
mas é que tu não vales um estalo.
depois eu ergo-me, eu arrumo, eu fumo um cigarro infeliz amargo,
dissolvo-te em pensamentos maliciosos
e agradeço que te tenhas ido.

o perigo reside na permanência. 

Raquel Dias

30 de agosto de 2013

dormir como uma mãe

o gato dorme, a mãe dorme,
eu entretenho-me no fingimento.
finjo-me feliz, coerente,
conforme me idealize a gente

o dia escorre, a noite desliza,
faço-me poetisa por consolo
antes que a brisa destrua
a minha alma de falso tijolo

ando nua pelas ruas do mundo
de rosto moribundo e pés gastos
em busca de um solo fecundo
onde possa dormir como um gato,

como uma mãe…


Raquel Dias

29 de agosto de 2013

ave migratória

o outono aproxima-se, sinto-o na pele, sinto-o na alma, ainda que seja um ténue arrepio ocasional…
da janela observo as manhãs em mutação,
o misticismo na lua que cresce,
na mão que me despe a memória,
parece demasiado distante,
e no entanto,
o bafo do verão já muda de trajectória

(quero que saibas que procurei-te pela praia,
devastei quilómetros, marés assombrosas,
fiz-te prosa nas madrugadas tristes,
mas tu preferiste não ser encontrado,

agora o outono amanhece-me o caminho, arrefece-me o desejo,
não serás mais que o espinho de sempre)

é tempo de partir como a folha que cai,
sinto-o na pele, sinto-o na alma,
o outono devolve-me a calma de uma ave migratória



Raquel Dias

27 de agosto de 2013

meu sonho

anda cá meu sonho,


retoma-me o corpo ausente
o desabamento é iminente e eu tenho medo da vertigem
devolve-me a maré alta de sossegos, a origem
o ventre quente,
que não me pisem as noites claras
as amarras ao céu longínquo!

oh! meu sonho, regressa!
contigo o prado, olhos amendoados,
tudo o que se dissipou em vida
os contos inacabados que persistem em ferida

que eu quero paz, eu mereço,
arrefeço a cada dia como um astro só

na foz da consciência habitam-me monstros
e é de escombros a matéria da vigia
- por isso prefiro a anarquia dos sonhos
o pesadelo mais medonho
à realidade sem magia


Raquel Dias

26 de agosto de 2013

noites mortas em mãos cegas

entre nós palavras indecisas concisas formas de consumir,
de lamber roer chupar até ao tutano
ao estranho sabor das partes clandestinas.
os meus cabelos tangerina, as tuas faces de criança,
lembrança de um passado vertiginoso
contagioso jeito de ser pensar estar
a alagar o peito de desordens
as ideias já mordem

entre nós palavras como pregos como pragas
nefastas negligências em vaivém
num perpétuo aquém das expectativas
lembranças antigas
a alagar o peito de formigas
o nosso filme surrealista a passar, a passar

...

entre nós 
constelações de cordas
noites mortas em mãos cegas



Raquel Dias

22 de agosto de 2013

distracções

Aqui interrompeu-se a cena. Ficamos quietos no desafogo, na inutilidade das palavras,
simulamos uma cegueira recíproca,
pensamos e ensaiamos o mundo na solidão,
afinal,
estamos sempre sós ainda que a sós num verbo plural.
São as distracções, as comoções desmedidas que nos penetram o espírito,
os olhos líquidos que me reaparecem na memória… 
(…no teu caso não sei)


¿y qué?

Levo constelações ao peito, transbordo asas e azares,
os mares fizeram-me assim,
a ti deram-te a dormência, a descrença, enfim, os mesmos infortúnios, presumo…

Aceitemos – porque não? - as distracções como parte integrante,
isto como algo feito à medida de loucos contemporâneos,
gente sem preconceitos ou preceitos tradicionais,


¿por qué no?



Raquel Dias


19 de agosto de 2013

eu não sou de ninguém

palavras onde a minha voz cabia:
Eu não sou de ninguém... Quem me quiser
Há-de ser luz do Sol em tardes quentes
Nos olhos de água clara há-de trazer
As fúlgidas pupilas das videntes

Há-de ser seiva no botão repleto,
Voz no murmúrio do pequeno insecto,
Vento que enfurna as velas sobre os mastros!...


Há-de ser Outro e Outro num momento!
Força viva, brutal, em movimento,
Astro arrastando catadupas de astros!


Florbela Espanca

13 de agosto de 2013

arte de simplificar.

A tua ausência prematura cresceu-me no peito, as rosas desabrocharam, os dias aqueceram, 
não se pode ter tudo, claro que se pode ter tudo, eu tive-te um dia. 

Pensamentos repetidos até à exaustão, uma porção de sementes, as cinzas, é de nós a flor que brota, 
são linhas retas, a avenida, a meta,
nem dei pela partida, sabes…
E a arte, a verdadeira arte pertence-te, o impenetrável império da carne e do sangue, tu tens a chave, não ma devolvas!
Nas paredes colecciono murros e furos, palavras que me decoram os olhos, borboletas na cabeça, espinhos nas mãos, as rosas, claro.
A culpa é tua. Enlouqueceste-me. 
E eu que tinha tantas saudades do futuro, e eu que tinha construído um muro… Para quê. Para nada.
Já nem os discursos do senso comum me consolam. 
Este ar é esmagador, ando nua pela casa, arrasto as asas pelo chão,
em tempos remotos eu voei,
lembras-te? tu estavas lá...
Agora aprendo o silêncio, a arte de simplificar o quotidiano, 
vai-se andando, com desânimos contidos, 
sentimentos moídos…
...nos vemos a la vuelta!



Raquel Dias






26 de julho de 2013

fusão

Dá-se a fusão
os teus olhos tristes
pedintes
Oxalá tu mo dissesses outra vez,
Meu amor, outra vez,
uma última vez…


A terra áspera
cor dos teus cabelos de seda
da noite rasgada
a pulsar por debaixo do fogo
e um coro de animais selvagens
a festejar-nos o impulso

Gosto de ouvi-los gosto de ti
assim, não tão perto,
apenas como um eco
dois olhos luminosos entre os arbustos

(oh, mas quem me dera…)
Raquel Dias




19 de julho de 2013

somam-se asfixias

Assim se fixa petrifica e permanece
comprimido reduzido à metade
se amaste eu não sei.

Canso-me na abstração
em vão procuro-te na mão vazia
sempre morro na periferia,
na histeria da indecisão.

O abalo é secreto
um irrequieto inseto
que procuro exterminar

Somam-se asfixias
     sinestesias ao peito descoberto
               até que do meu deserto
                    nasce a flor da poesia



Raquel Dias

14 de julho de 2013

pretextos existenciais

sinto-me ocasionalmente mal e doí-me o coração como se não existisse 
e neste fosso de aspirações ausentes é de terra infértil
que se enchem as veias e artérias e a matéria do meu ser


de olhos humedecidos, tudo parece saído de uma realidade astral

o meu verdadeiro nome soma-se à incerteza de um rosto
e o meu desgosto seria ainda assim reconhecer-me



antes não ser-me e eis um pretexto para existir



Raquel Dias

6 de junho de 2013

olhos de sombra

Nos teus olhos de sombra
é árvore a lembrança doutros tempos
onde serena a solidão tomba
na apreensão dos pensamentos.

É quiçá saudade, que sei…

8 de abril de 2013

coroa de orvalho



Essa doçura que não obedece,
amar-te em ossos tristes, olhos baços,
aos pedaços.

O orvalho é a minha coroa,

quer emigre da alma para o mundo
ou do mundo para dentro,
o aroma que te reveste
permanece,
magoa.

Eu dispo-me e flutuo,

na tempestade onde me abrigas
sou mais, maior,
um inseto,
nada.

Tu não és para os meus braços,
e no entanto…




Raquel Dias


3 de março de 2013



E é nas sombras,

na matéria ausente
que se preenche uma vontade incerta
brota uma poeta
à medida que tomba.




Raquel Dias